Luto perinatal e neonatal: A dor invisível

Para a mulher que perdeu o seu bebê aquela perda é única, não importa quantas vezes ela passou por isso e muito menos as estatísticas que tornam o aborto um evento comum.

 

É certo que 1 em cada 4 mulheres que engravidam vão sofrer um aborto até 22 semanas. Isso quer dizer que muitas mulheres já tiveram ou ainda vão ter uma perda gestacional (e pior, sozinhas e em silêncio…). O que isso quer dizer para quem está de luto? Nada!

 

“A perda de um filho é a maior dor que se pode ter”. Não é assim que dizem? Mas o aborto espontâneo ou um bebê que já nasce sem vida não é visto da mesma forma e isso só torna a dor ainda mais solitária.

 

Vamos registrar para nunca mais esquecer: Um filho não se substitui, a dor da perda não se mede pelo tempo de vida, muito menos de gestação. E se tinha apenas 8 semanas, 22 semanas, 1 dia, não importa. Garanto que ela já acha que a culpa é sua, que ela está imaginando inúmeros “e se…”. E não tem como nada ser bom. Não faz sentido, percebe? Dor não se mede pelo tempo nem pela forma como ocorreu nem pela estatística comum. 

 

Não contribua para piorar o que ela já sente. Era pra ser e É! Esse bebê existiu, sempre vai existir e não há nada que ninguém diga que irá aplacar a dor. Só o tempo vai amenizar, como é em todo luto.

 

Precisamos respeitar o luto perinatal e neonatal. Esse bebê podia já ter um nome, uma história, vinha junto com sonhos, espera e expectativas. Vai vir outro? Talvez outro, nunca mais esse. É uma vida não vivida, uma parte dela que foi embora, uma perda. É no seu ventre que crescia aquele ser que você não reconhece e é no seu próprio corpo que ela, e mais ninguém, vai sentir tudo. Os seios que vazam leite ou que murcham de repente; o sangramento que parece não ter fim e que a lembra a todo momento do que não foi, do que poderia ter sido; o enjoo que desaparece e ela nem fica feliz; a barriga que some; os cabelos que caem, a culpa por imaginar que essa perda atesta o seu fracasso como mulher. É muita carga emocional para administrar!

 

A falta de empatia das pessoas, muitas vezes até mesmo dos profissionais de saúde, pioram e muito a dor dessa mulher. A falta de um leito separado das mães que acabaram de ganhar seus bebês enquanto ela sofre com os braços vazios, a falta de grupos de apoio e de profissionais qualificados para acolher essa mãe e casal, a falta, é o que fica…

 

O que fazer então? Que tal, nada! Exercite o silêncio. Abrace, escute, acolha. Diga, simplesmente, o que se diz para alguém que perde uma pessoa amada: “sinto muito pela sua perda”, “estou aqui para o que precisar”.

 

Não contribua para silenciar e piorar uma dor que já não tem lugar!

Julia Veras

Julia Veras

Psicóloga CRP 04 / 29013, mãe, acadêmica na área de Letras. Tenho mais de 10 anos de experiência clínica com adultos, os últimos 5 anos com foco em puerpério, perinatalidade e parentalidade, e estou à frente do IPE – Instituto Perinatal.